PELOS BARES DO PARANÁ
Por Norberto Staviski
Com Bernardo Staviski & Raul Guilherme Urban
BAR BOTAFOGO
Faz um ano que o bar ganhou uma identificação pequena e singela na sua porta de entrada, na Avenida Manoel Ribas, 700, o que a é um sinal da troca de comando. Um dos seus fundadores e atual proprietário, Irineu Mazzarotto, o Quexo, está com 73 anos e aos poucos está passando o bastão para seu filho Dino, que já há alguns anos trabalha com ele. O que é um bom sinal, felizmente, de continuidade da tradição. Mas durante seus 55 anos de existência o Bar Botafogo ficou sem nenhuma identificação na sua fachada e funcionou com as portas fechadas. Quem passa pela frente sequer imagina que ali dentro se desenvolvem as conversas que estarão nas colunas ou nas páginas dos jornais do dia seguinte. E que ali funciona uma espécie de confraria formada por médicos, engenheiros, advogados, jornalistas e outros a profissionais liberais. E só homens.
MULHER PODE ENTRAR MAS...
Embora não seja proibida a entrada de mulheres, o ambiente não é propício. Quebra o clima. A conversa vai baixando até sumir. Alguns freqüentadores chegam a levar as esposas para conhecer o bar. Mas é só uma única vez. Elas não voltam jamais. E os maridos ganham uma espécie de alvará de soltura permanente desde que estejam no balcão ou numa das nove mesas do Botafogo. Isso que é um verdadeiro bar. Dele nem a mulher consegue reclamar.
E, por este e outros motivos, um lugar diferenciado, mas que atraiu freqüentadores como o ex-governador Ney Braga e o ex-prefeito e ministro Ivo Arzua. Até hoje parte de seus familiares vai ao bar.”Gente que era trazida no colo, hoje está vindo”. Comenta o Quexo, Irineu Mazzarotto. O segredo para a longevidade, a tradição do Botafogo, são os detalhes. Pelo fato de funcionar com as portas fechadas, atrai boa parte da elite curitibana, que não deseja ser vista bebericando ou afogando as mágoas. Com isso, foi se transformando numa espécie de clube de amigos onde, inclusive, cada um possui sua garrafa de uísque e um armário numerado onde se guardam as bebidas. E se elitizou na conversa inteligente, ao ponto de ser fonte para jornalistas de várias publicações até hoje. “ O dono de bar é um confessor”, filosofa Irineu Mazzarotto. “Tem de estar sempre atento à conversa e à vontade de desabafar do cliente”, completa. Suas tiradas são bem conhecidas: “ freguês diário de boteco é como atleta. Não dura mais de dez anos...” é uma. “Mulher entrar no Botafogo é como homem entrar num salão de beleza. Pode, mas não funciona...”, é outra. “Dono de bar tem de gostar do ramo porque sempre se faz primeiro o amigo e depois o cliente”, receita. E fez tantos amigos nos 55 anos de história do Botafogo, que eles só não vão no bar quando estão doentes. “ E mesmo assim telefonam avisando que não podem ir e o motivo clínico”, diz. Para Irineu, aliás, as mulheres deveriam agradecer a existência de bares como o Botafogo. “ É uma espécie de para-choque, onde o cara que trabalhou o dia inteiro vem descarregar suas frustrações. Ao invés de bater de frente com a mulher em casa. Quando sai daqui já está civilizado”, explica.
Na verdade, quem criou o Botafogo foram os irmãos de Irineu, Sílvio e Euclides Mazzarotto. Eles tinham uma barbearia no local e El foi se transformando em ponto de encontro. Como havia uma sala grande vazia ao lado, a idéia do bar foi um próximo passo. Mas Sílvio não agüentou o rojão do novo negócio e saiu um ano depois, quando entrou Irineu, que tinha acabado de prestar serviço militar. Já Euclides ficou até 1960 e também mudou de ramo. O nome Botafogo veio do fato de que os integrantes do clube amador, que existe até hoje e disputa a divisão de futebol suburbano de Curitiba, passaram a usar o lugar como sua sede e para reuniões por algum tempo. O clube saiu mas os clientes ficaram. Desde aquela época, o bar só saiu uma vez do lugar onde está até hoje: para duas quadras abaixo, quando foi construído o novo prédio. Quatro anos depois voltou ao lugar original. Essa é uma de suas vantagens: o Botafogo está sempre lá. Sua tradição o fez se transformar também na sede informal da secção curitibana da sociedade Brasileira do Whisky, um grupo de iniciados na bebia escocesa que, rotineiramente, faz lá suas reuniões a apreciações de uma ou outra bebida rara ou lançamento. Irineu recebeu até o título de “Spiritus Advisor” da sociedade, o que lhe confere status para comentar ou recomendar este ou aquele uísque. O “Quexo é, de fato, uma autoridade e um filósofo de bar”.
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